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Cortejando Um Semideus Arrogante
Índice
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Sobre a autora
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Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, instituições, lugares, eventos e acontecimentos são produtos da imaginação da autora ou foram utilizados de maneira ficcional. Quaisquer semelhanças com pessoas reais, vivas ou mortas, ou eventos da realidade não passam de coincidência.
Capa por Victoria Miller.
Copyright © 2021 por Rebekah Lewis
Todos os direitos reservados.
Este livro ou qualquer trecho dele não pode ser reproduzido ou utilizado de forma alguma sem uma autorização exprimida por escrito pela autora, exceto para o uso de citações curtas em resenhas.
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Para Niki e Nelly,
Não tivemos a chance de trabalharmos juntas por muito tempo, mas vocês transformaram aquela época no escritório em uma festa.
Obrigada.
Capítulo 1
11 de agosto de 1817
Bryce Stirling, o terceiro Conde de Winterthorne, cruzou os braços ao encarar, pela janela, o interior inglês em movimento. Summerfield ficava a apenas um dia de viagem de Londres, mas o problema não era essa.
— Não sei por que temos que ir… — Ele se virou e encarou a muitíssimo velha tataravó com um olhar que intimidaria a maior parte das pessoas. A Duquesa de Ceres, no entanto, pareceu entediada com as reclamações do homem. Reclamações, arrependia-se Bryce, das quais ele não abria mão desde que tinha sido informado que a acompanharia ao casamento de pessoas que o neto sequer conhecia. Honestamente, não compreendia por qual razão estava sendo arrastado ao interior contra sua vontade.
Claro, a tataravó não era uma velhinha frágil a quem ele tinha que agradar por dever ao laço familiar ou para ser educado. Não, a Duquesa de Ceres era ninguém menos do que a deusa Deméter, e, de acordo com a sociedade londrina, ela era tia dele. Isto, porque parecia ainda mais nova do que a mãe de Bryce, com a pele sem manchas, o cabelo ruivo e os olhos verdes brilhantes e atentos.
— Por que você está dificultando tanto a situação? Ione é sua prima…
— Prima de muitos graus — corrigiu-a o neto, ignorando o olhar que recebeu por não a deixar terminar a frase. — Eu não cresci com ela. Eu nunca sequer a conheci.
— É raro alguém que sabe da sua origem passar mais do que alguns dias em Londres. Faria bem a você ter uma conhecida com quem conversar. Se ao menos você pudesse ir ao Olimpo… — Deméter franziu a testa. Esta era uma queixa comum. Fazia tempo que Zeus tinha fechado os portões para os forasteiros, incluindo para os membros do próprio panteão que não estavam presentes quando o cadeado mítico foi fechado. Sendo semideus, Bryce deveria poder fazer uma visitinha ao outro lar ancestral quando desbloqueasse os seus poderes divinos, mas, infelizmente… nunca teria essa chance. Não havia como sentir falta daquilo que nunca tinha vivido. Por alguma razão, a ideia de jamais visitar o Olimpo sequer o incomodava.
— Não preciso conversar com ninguém sobre isso. — Por que precisaria? Ser um semideus tinha seus pontos positivos, mas não era como se a sua condição tivesse se tornado um fardo tão grande ao ponto de Bryce não a aguentar. Ainda era novo, tinha vinte e cinco anos e uma vida toda para aproveitar suas… habilidades.
— As irmãs de Ione vão estar lá. Bem, pelo menos um punhado delas. Nem todas vão conseguir comparecer, já que têm outras obrigações.
Em resposta a isso, Bryce bufou. Que tipo de obrigações uma sereia tinha?
— Tenho certeza de que as ninfas do mar são uns amores, mas não tenho interesse em ser atormentado nem em ser afogado por uma delas. — Era o que elas faziam, afinal de contas. O fato de o Capitão Harlow estar se casando com uma ninfa que havia rejeitado aquela parte de seu ser era um acidente e nada mais. Desejava sorte ao homem.
Deméter assentiu.
— É o meu sangue correndo pelas suas veias que o deixa tão preocupado. Você quer ficar em terra, e o mar parece que está fora de questão para você. — Ela alisou a saia verde desbotada do vestido, que exibia rendas prateadas e bordados de contas. — Isso, e o medo de ser levado e enganado como aquele filho horrendo do…
Ele ergueu a sobrancelha.
Pigarreando, Deméter continuou, a voz mais calma:
— O que eu quero dizer é que… o sofrimento de Perséfone se transformou em um estresse sem fim dentro da nossa linhagem. Talvez seja culpa minha, também. — Ela deu de ombros e encarou o teto, como se buscasse o perdão pela reação exagerada, há tantos séculos, quando os tios avós de Bryce, Perséfone e Hades, abalaram o panteão com seu casamento. Deméter nunca perdoou Hades. — Se ele não a tivesse enganado com aquela romã…
Não querendo entrar naquele assunto outra vez – porque, quando ela começava a reclamar de Hades, a conversa podia se arrastar por dias –, Bryce voltou a focar nas ninfas do mar, com quem a tataravó queria arranjar um encontro para ele.
— Respirar estaria fora de questão para mim caso eu sequer olhasse por tempo demais para uma dessas ninfas. — Sem mencionar que os poderes dele estavam enraizados na terra, e o homem não pretendia se afastar de sua fonte de poder.
— Ah, que seja. Mas não significa que você não possa se divertir e conhecer a Ione e o Capitão Harlow. Você precisa de mais amigos em Londres, dos quais não tenha que esconder o seu verdadeiro eu. Como eu lhe disse, faria bem a você.
Ela tinha razão, mas Bryce não precisava concordar. Teria preferido conhecê-los em Londres. Aparentemente, havia comparecido a um baile, há pouco tempo, onde tanto ele quanto Ione estiveram presentes, mas Deméter não achou prudente apresentá-los naquela ocasião – só os deuses sabem por qual razão. Poderia tê-lo poupado de uma viagem inoportuna de carruagem.
Permaneceram em silêncio pelo resto do caminho, que não se alongou muito. Após ajudar Deméter a descer da carruagem, virou-se e encarou a Mansão Summerfield. Era peculiar, apesar de pertencer a um visconde. O Capitão Harlow, na maior parte do tempo, morava ali sozinho – de acordo com os rumores –, enquanto o visconde e a viscondessa, junto com os três filhos, preferiam a agitação e o burburinho de Londres. Os arbustos e os canteiros estavam bem cuidados, mas logo ficou aparente que, quem quer que fosse responsável pela propriedade não tinha muita imaginação se tratando de criar um jardim imponente e digno de receber visitas.
— Devo insistir para que não se meta com a flora deles, Bryce. — A firmeza no tom de Deméter chamou-o de volta para a realidade. — Com certeza notarão, e nem todo mundo aqui sabe que existem olimpianos entre eles.
— Bem, mas nem sempre consigo controlar a necessidade de usar magia. — O mau humor continuou a piorar. Odiava quando recebia broncas como se ainda fosse um garotinho. Era um homem agora. Seu poder de criar e controlar plantas era facilmente mantido em segredo quando em casa, em Winterthorne, com seu grande invernadouro e jardins, mas, na grande casa em Londres, o diminuto jardim e estufa não eram de grande ajuda. A terra o chamava para ser semeada e cuidada, e algumas flores cairiam muito bem em Summerfield, mesmo que não fosse ele o responsável por plantá-las.
Os criados os levaram para dentro da mansão, então, foram rapidamente guiados ao outro lado, passaram pela porta dos fundos e deram de cara com um penhasco com vista para o Mar do Norte. Abaixo, um pedaço de floresta encobria a descida que acabava na praia, que, por enquanto, permanecia fora de vista, apesar do ar e da brisa marinhos. Pelo menos, havia um montão de árvores ali. Bryce emitiu um chiado baixinho, impaciente. Deméter o encarou de soslaio, furiosa, e ele fingiu não ter percebido. Em vez disso, focou nas pessoas ao redor.
Um padre conversava com um cavalheiro mais velho, e Bryce o reconheceu rapidamente como o Visconde de Summerfield. Havia muitas mulheres se demorando por ali, com chapéus elaborados que cobriam o cabelo, mas o vislumbre de uma mecha toda violeta lhe chamou a atenção quando uma das moças prendeu o cacho solto sob o chapéu, escondendo-o. Ah, as ninfas do mar. Eram conhecidas por suas cores interessantes; muitas não conseguiam passar desapercebidas por conta disso.
— Parece que nos atrasamos para a cerimônia. — Deméter apontou para a esquerda, onde uma mulher de cabelo dourado e pele beijada pelo sol sorria amavelmente para um homem de cabelo escuro, que segurava as duas mãos dela enquanto lhe dizia algo. Diversas ninfas os bajulavam, exibindo curiosidade – algumas até mesmo inveja, caso os seus biquinhos provassem algo. — Vou cumprimentá-las e as trarei aqui. Não saia do lugar.
Como se Bryce tivesse algum outro lugar para ir… mas, logo que Deméter desapareceu na multidão de ninfas, o homem se mandou na direção oposta, lançando olhadelas ao redor e evitando as pessoas como podia.
Quando ninguém mais parecia se importar com ele, agachou-se e passou pelos arbustos nos limites da mansão, logo, contornou-a e, então, piscou. Uma estufa se assomava no limite das árvores, escondida da parte da frente da casa por um muro de pedras e por um portão de ferro fundido. Com certeza, Deméter o acabaria encontrando ali, mas era um esconderijo que, por enquanto, daria para o gasto.
Atravessou o terreno e alcançou a estufa. Em seguida, verificou se estava trancada, mas conseguiu abri-la sem dificuldade. Deu uma olhadinha sobre o ombro para garantir que não tinha sido seguido, esgueirou-se para dentro e fechou a porta. Soltando um suspiro aliviado, fechou os olhos e inalou o aroma suave e terroso das folhas e das flores fragrantes. Não se interessava nem um pouco em fazer amigos, e a pontinha dos dedos coçava com a vontade de usar a energia que não podia ser exibida na frente dos mortais.
Quando abriu os olhos e se virou para analisar o que a estufa tinha a lhe oferecer, deu de cara com os olhos grandes e muito azuis de uma jovem de cabelo marrom-escuro, envolta por um vestido rosa desbotado, que combinava perfeitamente com o corar rosado de suas bochechas. Bryce perdeu o fôlego. Por que ficou surpreso em tê-la encontrado ali? Por que a sua beleza tinha feito as entranhas dele se remexerem de um jeito estranho? Uma situação interessante, sem dúvida.
— Eu te conheço — disse ela, de repente, levantando-se da cadeira ao lado de uma mesa diminuta nos fundos da estufa. A mulher tinha estado podando folhas mortas de uma pequena lavanda do vaso logo em frente. — Conde de Winterthorne, acho. Mas não fomos devidamente apresentados.
Ele assentiu, e um cacho louro de seu cabelo caiu sobre os olhos. Então, devolveu-o ao lugar.
— Eu mesmo. E quem tenho o privilégio de encontrar nesta estufa sossegada à beira-mar? — Nossa, ele realmente tinha exagerado, não tinha? Estremeceria se ela não estivesse acompanhando todos os movimentos dele, como se tentando descobrir todos os seus segredos.
— Senhorita Wendelin Harlow. — Ela fez uma mesura, e Bryce não soube dizer se estava sendo educada ou zombando-o. No entanto, agora que sabia quem ela era, o fato de aquela moça estar ali deixou tudo muito mais interessante.
Apoiou as costas na porta e cruzou os braços, dando a ela o seu sorriso mais malandro.
— E o que, conte-me, por favor, a irmã do noivo está fazendo escondida no dia do casamento dele?
Ela piscou, pois claramente não estava esperando ser acusada de tal coisa, mesmo sendo verdade.
— Ah… bem… — A moça sentou-se outra vez. — Meus irmãos são superprotetores. — Ela franziu a testa para a planta em sua frente, então, para a pilha de folhas mortas que ela mesma havia criado ao lado do vaso. — Eu estava caminhando ao redor da propriedade com o Duque de Shellington, e acho que ele tentou me roubar um beijo… — Ela corou e deu uma espiada em Bryce pelo canto do olho.
O homem não achou que ela fosse revelar algo tão escandaloso, e o conde não sabia quem o Duque de Shelligton era. Nunca tinha ouvido falar nele, o que não fazia sentido. Se era um nobre – um duque ainda por cima –, com certeza deveria conhecê-lo. De repente, ficou irritado – porque não conseguia se lembrar do duque, obviamente, e por nenhuma outra razão –, mas assentiu para que ela continuasse.
— Jonathan estava saindo da casa quando o Lorde Shelligton se inclinou sobre mim… Meu irmão teve um acesso de fúria que atraiu diversos espectadores para o que estava acontecendo. Ele não me deixou mais sozinha e me fez ficar ao lado dele durante o casamento, para manter o Lorde Shellington longe de mim. — Ela suspirou, apesar de não ter ficado claro se por conta das atitudes do irmão ou se porque queria que o duque a tentasse roubar um beijo outra vez. Estaria aquela lady correndo atrás de escândalos?
Sem descruzar os braços por completo, Bryce indicou os arredores com uma das mãos.
— Não estou vendo o seu irmão aqui. Você fez picadinho dele e o enterrou nesses vasinhos de flor?
A Senhorita Harlow o encarou por um momento, boquiaberta.
— Você subestima demais a habilidade de Jonathan de me atormentar. Ele voltaria dos mortos se fosse para me atazanar — disse ela, rindo. O som suave e tilintante fez o coração dele bater um pouquinho mais rápido, e Bryce se afastou da porta, aproximando-se dela, mas parou, desajeitado, ao lado da mesa.
— Você gosta de plantas?
Sorrindo, ela encontrou os olhos dele.
— Muito. Não tenho chance de cuidar delas tanto quanto antes, mas, quando visito Summerfield, gosto de passar o maior tempo possível aqui. — Ela olhou ao redor, para as prateleiras nos dois lados da construção, cobertas por vasos e botões em plena floração. — É uma pena nada disso sobreviver na terra.
Mas que coisa esquisita para se dizer.
— Como assim?
— Plantei rosas na primavera passada, na frente da casa, sob as janelas gigantes. — Ela fez uma pausa, esperando para ver se o homem tinha notado as janelas mencionadas. Bryce assentiu. — Em vez de florirem, morreram. Tínhamos um jardim riquíssimo, entretanto, há uns cinco anos, parece que nada com flores sobrevive. Mas, por alguma razão, sobrevivem aqui dentro da estufa. — Ela deu de ombros. — É muito estranho.
Bryce veria o que poderia ser feito a respeito daquilo antes de partir pela manhã. Era verdade que tinha perdido o casamento, algo que não o aborrecia, mas ainda haveria um jantar de comemoração no finzinho daquela tarde, e continuariam presos ali pela noite. Descobriria por que as flores não cresciam e corrigiria a situação. Isso não apenas faria uma linda lady sorrir, como ele poderia libertar, ao longo do processo, um pouquinho de magia reprimida.
— Não desista das flores, pequenina. O solo pode ser caprichoso quando não está a fim de criar vidas. Tente outra vez, talvez funcione.
— Você acha mesmo? — Os olhos dela se iluminaram com um tanto de esperança, o que o obrigou a engolir a vontade de prometer que, sim, as flores sobreviveriam.
— Pode-se dizer que eu pratico muita jardinagem. — O homem deu de ombros, para fingir que sua paixão pouco importava a ele. Algumas pessoas achavam estranho um conde gostar de trabalhar com terra e plantas. — É o meu passatempo.
A Senhorita Harlow parecia ter mais a dizer, mas seja lá o que fosse desapareceu quando a porta da estufa foi aberta atrás dele.
— Te achei, eu… — O homem parou de falar abruptamente quando percebeu que a Senhorita Harlow não estava sozinha.
Bryce se virou para encarar o recém-chegado, esperando que fosse um dos irmãos que se pareciam com ela. Em vez disso, um homem alto, com olhos verde-mar e cabelo preto, que exibia um tom azulado, olhou-o com desprezo. O saber inato da linhagem de Bryce foi suficiente para lhe dizer que aquele homem não era humano, ou seja, deveria ser parente de Ione. Ninfas do mar eram todas mulheres, o que fazia dele… um tritão. Um dos muitos, muitos filhos do deus que levava o mesmo nome.
Todos os quais, Bryce tinha certeza, eram idiotas.
— Lorde Shelligton — disse a Senhorita Harlow, levantando-se. Bryce firmou a sua posição na frente dela. Apesar dos tritões não terem o costume de afogar amantes, como as sereias – parte do incômodo era deixar a mulher viver para lidar com os filhos –, caso um tritão estivesse de olho na Senhorita Harlow, não teria como isso terminar bem para ela. Esses seres não cultivavam relacionamentos duradouros, apenas queriam parceiras para procriarem.
Raios, nem o pai deles era de manter a mesma amante por muito tempo, e a lenda dizia que Tritão tinha produzido três mil filhos e três mil filhas para povoar o reino oceânico de Poseidon. Esse número deveria ser um exagero, mas, por outro lado, também não chegava a parecer impossível para um deus com a idade de Tritão.
Shelligton o lançou um olhar de cima abaixo, contaminado por hostilidade. Bryce deu o troco na mesma moeda. Atrás dele, a Senhorita Harlow apoiou a palma da mão em seu braço, e os músculos do homem contraíram em resposta ao toque. Bryce não tinha estado esperando nada nisso. Ninguém o tocava sem que ele os tivesse tocado primeiro. Geralmente, a atitude ousada dela o teria irritado, mas não odiou a sensação de contato com a jovem.
— Preciso voltar antes que Jonathan venha me procurar de novo. — Ela olhou de um homem ao outro ao passar por Bryce. — Foi um prazer conhecê-lo, Lorde Winterthorne. — A Senhorita Harlow assentiu ao tritão que fingia ser duque. Isso explicava por que Bryce nunca tinha ouvido falar nele. — Vossa Graça.
Quando ela se apressou ao sair da estufa, Bryce sentiu a ausência dela no mesmo instante. Mas, primeiro, teria que colocar o tritão na linha.
— Sim, Vossa Graça — zombou. — Ela está fora de cogitação para você.
Shelligton bufou, indignado.
— Nenhuma mulher está fora de cogitação para mim,
— Essa está.
O tritão se aproximou, parecendo um duque até o último fio de cabelo, em seu casaco e calça cinza-escuros. O peitilho branco e limpo exibia um broche de safira preso bem no centro. Bryce o odiou instintivamente. Aquelas roupas perfeitas e aquele cabelo preto azulado… tentando beijar mulheres jovens e inocentes, sem vergonha alguma, na frente de seus irmãos… Falando nisso, provavelmente deveria estar interessado em procriar com ela. A pobre garota estaria arruinada e presa a uma criança, que seria abduzida em uma noite qualquer caso fosse do sexo masculino. Por qual razão Ione havia sequer convidado os tritões para o casamento? Estaria o Capitão Harlow ciente do perigo que aquela criatura era para a irmã? Pelo menos, Jonathan estava ciente da situação, apesar de Bryce não saber, naquele momento, se o irmão realmente compreendia a proporção da ameaça.
— Isso me soa como uma aposta, e eu nunca recuso uma aposta. — Shelligton tamborilou os dedos na coxa. — Você acha que eu não vou conseguir conquistar a garota, mas eu acho que consigo.
Uma irritação ainda mais intensa percorreu seu corpo.
— Não vou apostar nada. Estou mandando você deixar a mulher em paz. Se quiser chamar isso de algo, chame de ameaça. Ou de aviso.
O tritão estalou a língua.
— Coitadinho do semideus, deve estar morrendo de raiva por eu a ter descoberto antes de você. Claro, se tivesse chegado na hora, poderia ter tido alguma chance. Ou não, já que você não passa de um mero conde.
— Um conde legítimo, pelo menos. — Por que ele sequer estava dando corda para aquela discussão? Não era como se Bryce estivesse tentando ter uma chance com ninguém. — Você entendeu tudo errado. Só quero salvá-la da ruína que seria se envolver com um homem como você. Um duque falso.
Shellington deu um peteleco em um grão de poeira que havia aterrissado em seu braço.
— Sou tão real quanto desejo ser. De qualquer maneira, primeiro, tenho que me estabelecer em Londres antes de persegui-la de verdade, o que realmente pretendo fazer. Admito, no começo, foi apenas pelo entretenimento, mas ao notar quão na defensiva você está, quero ver o seu rosto quando ela me escolher. Mulher alguma rejeita um tritão.
Bryce cerrou os dentes para se impedir de responder, pois sabia que isso apenas pioraria tudo.
— Não me importo com quem ela escolher ficar no fim, mas será com um homem que realmente se importa com a reputação dela. — Pareceu estar se importando demais para que as palavras soassem verdadeiras. Teria o tritão visto algo a mais do que Bryce tinha notado em seu encontro com a mortal?
— Daqui a um ano, no começo da Temporada, nossa aposta começa.
Bryce já estava cansado daquela tolice.
— A Temporada começa depois do Natal. Você quis dizer, então, no começo da Curta Temporada?
— Alguém realmente a chama assim? — O tritão nem sequer piscou. — Você topa ou não?
— Não vou apostar nada com você. — Muito poderia acontecer em um ano. Poderia, por exemplo, garantir que a senhorita Harlow estivesse casada antes de a aposta começar. Ele tinha diversos conhecidos que seriam um bom partido, mas, quando os considerou um a um, dispensou-os de imediato com base em uma ou outra desculpa.
— Porque você sabe que vai perder — provocou Shelligton.
— Porque eu não quero nada de você quando eu ganhar. — Ao dizer isso, seu poder reverberou, ganhando vida dentro de si, enquanto a irritação atingia seu pico, e Bryce cerrou os punhos. Pelo cantinho do olho, botões irromperam em flores maduras nos vasos da direita.
Shellington olhou para as flores, com uma expressão entediada no rosto.
— Que fofo. Você tem um dom tão delicado… Ah, deixe-me te lembrar que consigo satisfazer uma mulher simplesmente cantando para ela.
— Seria uma pena reduzi-lo a um soprano, então. — Não havia como saber se o comentário sobre a cantoria era verdadeiro ou não. As sereias eram um tipo completamente diferente de ser, apesar das lendas que, em algum momento, as misturavam com os tritões.
O tritão riu e se virou, mas parou ao alcançar a porta.
— Um ano. Um de nós conquistará o coração da linda Senhorita Harlow e o direito de se gabar a todos que foi melhor do que o outro.
Bryce revirou os olhos. Talvez, se entrasse no jogo, Shelligton finalmente iria embora e lhe daria um momento de paz.
— E o perdedor?
— O que acha de deixarmos as coisas interessantes? — A voz dele assumiu um tom perverso. — O perdedor abre mão da imortalidade.
Aquilo tudo era ridículo, mas quando viu a porta ser fechada com força assim que o tritão se foi, ele ser permitiu ter um momento para considerar o que havia acontecido. Muito realmente poderia acontecer em um ano, lembrou-se. Seria melhor se a Senhorita Harlow estivesse casada antes do início da próxima Temporada – para o bem de todos os envolvidos.