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Aus der Reihe: Memórias de um Vampiro #1
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“Deixem ele em paz!” ela gritou para o grupo.

O garoto no meio, com pelo menos 1,95 m de altura e musculoso, riu.

“Ou o quê?” ele perguntou com uma voz muito grossa.

Caitlin sentiu o mundo passar por ela, e percebeu que acabara de ser empurrada pelas costas. Ela levantou os cotovelos enquanto caía no concreto, mas isso mal amorteceu a sua queda. Pelo canto do seu olho, ela pôde ver seu diário voar, os papéis soltos se espalhando por todo o lugar.

Ela ouviu risos. E então, pegadas vindo na direção dela.

Com o coração batendo forte no peito, a adrenalina dela entrou em ação. Ela conseguiu rolar e se levantar desajeitadamente antes que eles a alcançassem. Ela fugiu por um beco próximo, correndo à toda velocidade.

Eles a seguiam de perto.

Em uma de suas muitas escolas, quando Caitlin acreditava que teria um longo futuro em algum lugar, ela teve aulas de atletismo e corrida, e percebeu que era boa nisso. A melhor do time, na verdade. Não em longas distâncias, mas em corridas de 100 metros. Ela conseguia vencer até mesmo a maioria dos rapazes. E agora, tudo aquilo havia voltado para ela.

Ela correu o mais rápido que pôde, e os garotos não conseguiram alcançá-la.

Caitlin olhou para trás e viu que eles estavam se afastando, e se sentiu otimista sobre conseguir fugir de todos. Ela apenas precisava fazer as curvas certas.

O beco terminava em um T, e ela podia virar para a esquerda ou para a direita. Ela não teria tempo de mudar de ideia se quisesse manter a sua vantagem, e teria que decidir rápido. No entanto, ela não conseguia ver o que a esperava depois da curva. Cegamente, ela virou para a esquerda.

Ela rezou para que fosse a escolha certa. Vamos lá. Por favor!

Seu coração parou quando ela fez a curva acentuada para a esquerda e viu a rua sem saída em sua frente.

Escolha errada.

Uma rua sem saída. Ela correu para o muro, procurando por uma saída, qualquer saída. Percebendo que não havia nenhuma, ela se virou para confrontar seus agressores, que se aproximavam.

Sem fôlego, ela os viu fazer a curva e se aproximar. Ela podia ver por cima de seus ombros que, se ela tivesse virado para a direita, estaria livre. Claro. Já era de se esperar.

“OK, vadia,” um deles disse, “agora, você vai sofrer.”

Percebendo que ela não tinha como fugir, eles caminharam na direção dela, ofegantes, sorridentes e saboreando a violência que estava por vir.

Caitlin fechou os olhos e respirou fundo. Ela tentou desejar que Jonah se acordasse, aparecesse na esquina, acordado e poderoso, pronto para salvá-la. Mas abriu os olhos e ele não estava lá. Apenas os seus agressores. Chegando mais perto.

Ela pensou em sua mãe, no quanto a odiava, em todos os lugares nos quais ela foi forçada a morar. Ela pensou no seu irmão Sam. Ela pensou em como a sua vida seria depois daquele dia.

Ela pensou em toda a sua vida, em como ela sempre tinha sido tratada, em como ninguém a entendia, em como nada dava certo para ela. E algo aconteceu. De alguma forma, ela havia alcançado o seu limite.

Eu não mereço isso. EU NÃO mereço isso!

E então, repentinamente, ela sentiu.

Era uma onda, algo diferente de tudo o que ela havia experimentado. Era uma onda de raiva, inundando-a, limpando o seu sangue. Ela estava centralizada em seu estômago, e se espalhou dali. Ela conseguia sentir seus pés enraizados no chão, como se ela e o concreto fossem um só, e então pôde sentir uma força primitiva se apoderar dela, fluindo pelos seus pulsos, pelos seus braços, chegando até os seus ombros.

Caitlin deixou escapar um rugido primitivo que surpreendeu e assustou até a ela mesma. Quando o primeiro garoto se aproximou dela e colocou sua mão grande no pulso dela, ela observou quando a sua mão reagiu sozinha, agarrando o pulso do agressor e torcendo-o para trás em um ângulo reto. O rosto do garoto se contorceu em choque enquanto o seu pulso, e depois o seu braço, era quebrado em dois.

Ele caiu de joelhos, gritando.

Os outros três garotos arregalaram os olhos, surpresos.

O maior dos três avançou contra ela.

“Sua filha da—”

Antes que ele pudesse terminar, ela havia pulado e plantado seus dois pés no meio do seu peito, fazendo-o voar por cerca de três metros e cair em uma pilha de latas de lixo.

Ele ficou lá, sem se mexer.

Os outros dois garotos olharam um para o outro, em choque. E verdadeiramente assustados.

Caitlin avançou e, sentindo uma força desumana fluir dentro dela, ouviu a si mesma rosnar quando pegou os dois garotos (cada um com o dobro do tamanho dela), e os levantou do chão com uma única mão.

Com ambos pendurados no ar, ela os balançou para trás, depois bateu um contra o outro com uma força incrível. Os dois caíram no chão.

Caitlin ficou ali, respirando, espumando de raiva.

Todos os quatro garotos não se moviam.

Ela não sentiu alívio. Pelo contrário, ela queria mais. Mais garotos com quem brigar. Mais corpos para jogar.

E ela queria algo mais.

De repente, ela tinha a visão perfeita, e era capaz de focar em seus pescoços expostos. Ela conseguia enxergar coisas minúsculas, e podia ver, de onde estava, as veias pulsando em cada um. Ela queria morder. Se alimentar.

Sem entender o que estava acontecendo com ela, ela virou a cabeça para trás e soltou um gritou sobrenatural, ecoando nos prédios e por toda a quadra. Era um grito primitivo de vitória, e cheio de raiva não satisfeita.

Era o grito de um animal que queria mais.

Capítulo Dois

Caitlin ficou parada na frente da porta de seu novo apartamento, e de repente, percebeu onde estava. Ela não tinha ideia de como havia chegado ali. A última coisa de que se lembrava era de ter estado no beco. De alguma forma, ela havia chegado em casa.

No entanto, ela lembrava de cada segundo do que aconteceu naquele beco. Ela tentou apagar aquilo da mente, mas não conseguiu. Ela olhou para seus braços e mãos, esperando que eles estivessem diferentes—mas eles estavam normais. Exatamente como sempre foram. A raiva que havia tomado conta dela, que a transformou, havia sumido tão rápido quanto chegou.

Mas os efeitos dela permaneciam: um deles era um sentimento de estar oca. Dormente. E ela sentiu algo mais. Ela não conseguia entender o que era. Imagens continuavam surgindo em sua mente, imagens dos pescoços expostos daqueles garotos. Do coração deles pulsando. E ela sentiu uma fome. Um desejo.

Caitlin realmente não queria voltar para casa. Ela não queria ter que lidar com a mãe, especialmente hoje, não queria ter que lidar com uma casa nova, desempacotar suas coisas. Se não fosse pelo fato de Sam estar lá, ela poderia simplesmente dar meia volta e ir embora. Para onde iria, ela não tinha a mínima ideia—mas, pelo menos, ela estaria caminhando.

Ela respirou fundo e colocou a mão na maçaneta. Ou a maçaneta estava quente, ou a mão dela estava fria como gelo.

Caitlin entrou no apartamento muito iluminado. Ela conseguiu sentir o cheiro de comida no fogão—ou provavelmente, no micro-ondas. Sam. Ele sempre chegava em casa cedo e fazia seu próprio jantar. Sua mãe não chegaria até mais tarde.

“Parece que não foi um bom primeiro dia.”

Caitlin se virou, chocada ao ouvir o som da voz de sua mãe. Ela estava sentada lá, no sofá, fumando um cigarro, olhando para Caitlin com desprezo.

“O que você fez, já estragou esse suéter?”

Caitlin olhou para baixo e percebeu pela primeira vez as manchas de sujeira; provavelmente por cair no cimento.

“Por que você está em casa tão cedo?” Caitlin perguntou.

“Primeiro dia para mim também, não é?” ela retrucou. “Você não é a única. O chefe me mandou para casa mais cedo.”

Caitlin não podia aguentar o tom desagradável de sua mãe. Ela sempre agia de maneira arrogante com ela, e hoje, Caitlin já estava cansada daquilo. Ela decidiu dar à mãe um pouco do seu próprio veneno.

“Ótimo,” Caitlin respondeu rispidamente. “Isso quer dizer que nós vamos nos mudar de novo?”

Sua mãe se levantou de repente. “Veja lá como fala!” ela gritou.

Caitlin sabia que a mãe estava apenas esperando por uma desculpa para gritar com ela. Ela decidiu que era melhor jogar a isca e acabar logo com aquilo.

“Você não devia fumar perto do Sam,” Caitlin respondeu friamente, depois entrou em seu quarto minúsculo e bateu a porta, trancando-a.

Imediatamente, sua mãe bateu na porta.

“Saia daí, sua pirralha! Isso é jeito de falar com a sua mãe!? Sou eu quem coloca comida na sua mesa…”

Naquela noite, Caitlin, distraída, conseguiu abafar a voz da mãe. Em vez disso, ela ficou relembrando os eventos do dia. O som da risada daqueles garotos. O som do seu próprio coração batendo em seus ouvidos. O som do seu próprio rugido.

O que, exatamente, havia acontecido? Como ela havia conseguido tanta força? Foi apenas uma descarga de adrenalina? Uma parte dela desejou que fosse. Mas outra parte dela sabia que não era. O que era ela?

As batidas em sua porta continuaram, mas Caitlin mal as ouvia. Seu telefone celular estava em sua mesa, vibrando como louco, acendendo com mensagens instantâneas, SMS, e-mails, conversas do Facebook—mas ela mal ouvia aquilo também.

Ela foi até a sua pequena janela e olhou para baixo, para a esquina da avenida Amsterdam, e um novo som chegou até a sua mente. Era o som da voz de Jonah. A imagem do seu sorriso. Uma voz baixa, forte, suave. Ela se lembrou de quão delicado ele era, quão frágil ele parecia. Então, ela o viu caído no chão, ensanguentado, seu precioso instrumento em pedaços. Uma nova onda de raiva cresceu.

 

A sua raiva se transformou em preocupação—preocupação em saber se ele estava bem, se ele conseguiu caminhar, se chegou em casa. Ela o imaginou chamando por ela. Caitlin. Caitlin.

“Caitlin?”

Uma nova voz estava do outro lado da porta. Uma voz de menino.

Confusa, ela voltou à realidade.

“É Sam. Me deixe entrar.”

Ela foi até a porta e inclinou a cabeça contra ela.

“Mamãe saiu,” disse a voz do outro lado. “Ela foi comprar cigarros. Vamos, me deixe entrar.”

Ela abriu a porta.

Sam ficou parado ali, olhando para ela, com preocupação no rosto. Aos 15 anos, ele parecia mais velho. Ele havia crescido rápido, e media quase um 1,80 m, mas ainda não havia se desenvolvido, e era desajeitado e desengonçado. Com cabelos pretos e olhos castanhos, a coloração dele era parecida com a dela. Eles definitivamente pareciam ser parentes. Ela podia ver a preocupação no rosto dele. Ele a amava mais do que qualquer coisa.

Ela o deixou entrar, fechando a porta rapidamente.

“Desculpe,” ela disse. “Eu só não consigo lidar com ela hoje.”

“O que aconteceu entre vocês duas?”

“O mesmo de sempre. Ela estava no meu pé desde o momento em que entrei em casa.”

“Eu acho que ela teve um dia difícil,” Sam disse, tentando apaziguar as coisas entre elas, como sempre. “Eu espero que eles não a despeçam novamente.”

“Quem se importa? Nova York, Arizona, Texas…Quem se importa com o que virá? As nossas mudanças nunca vão acabar.”

Sam franziu a testa quando sentou na cadeira da sua mesa, e ela se sentiu mal imediatamente. Às vezes, ela era áspera com as palavras, falava sem pensar, e desejou que pudesse retirar o que havia dito.

“Como foi o seu primeiro dia?” ela perguntou, tentando mudar de assunto.

Ele encolheu os ombros. “Foi bom, eu acho.” Ele tocou a cadeira com o pé.

Ele olhou para ela. “E o seu?”

Ela encolheu os ombros. Devia haver algo na expressão dela, já que ele continuou com o olhar fixado nela.

“O que aconteceu?”

“Nada,” ela disse, defensiva. Ela se virou e caminhou na direção da janela.

Ela podia senti-lo olhando para ela.

“Você parece…diferente.”

Ela parou, se perguntando se ele sabia, se a sua aparência exterior mostrava qualquer mudança. Ela engoliu em seco.

“Como?”

Silêncio.

“Eu não sei,” ele respondeu finalmente.

Ela olhou para fora da janela, assistindo sem reação à um homem no bar da esquina passando um saquinho de maconha a um comprador.

“Eu odeio esse lugar novo,” ele disse.

Ela se virou e olhou para ele.

“Eu também.”

“Eu até estava pensando em...” ele abaixou a cabeça, “…ir embora.”

“O que você quer dizer?”

Ele encolheu os ombros.

Ela olhou para ele. Ele parecia realmente deprimido.

“Para onde?” ela perguntou.

“Talvez…encontrar o papai.”

“Como? Nós não temos nenhuma ideia de onde ele está.”

“Eu poderia tentar. Eu poderia encontrá-lo.”

“Como?”

“Eu não sei…. Mas eu poderia tentar.”

“Sam. Ele pode até estar morto a essa altura.”

“Não diga isso!” ele gritou, e seu rosto ficou vermelho.

“Desculpe,” ela disse.

Ele se acalmou.

“Mas você já pensou que, mesmo se nós o encontrarmos, ele pode não querer nos ver? Afinal, ele foi embora. E ele nunca tentou manter contato.”

“Talvez por que a mamãe não deixe.”

“Ou talvez por que ele simplesmente não gosta de nós.”

As rugas na testa de Sam ficaram mais profundas ao se levantar novamente. “Eu procurei por ele no Facebook.”

Os olhos de Caitlin se arregalaram, surpresos.

“Você o achou?”

“Eu não tenho certeza. Haviam quatro pessoas com o mesmo nome dele. Dois deles tinham perfis privados e nenhuma foto. Eu mandei uma mensagem para os dois.”

“E?”

Sam balançou a cabeça.

“Ainda não tive resposta.”

“O papai não estaria no Facebook.”

“Você não sabe disso,” ele respondeu, mais uma vez na defensiva.

Caitlin suspirou, caminhou até a sua cama e se deitou. Ela olhou para o teto amarelo, com a tinta descascando, e se perguntou como todos eles haviam chegado àquele ponto. Haviam cidades onde eles tinham sido felizes, até momentos em que a mãe deles parecia quase feliz. Como quando ela estava namorando aquele cara. Feliz o suficiente, pelo menos, para deixar Caitlin em paz.

Haviam cidades, como a última, onde ela e Sam tinham feito alguns bons amigos, nas quais eles realmente pareciam poder ficar—pelo menos por tempo suficiente para se formar. E então, tudo pareceu mudar tão rápido. Mais uma mudança. Dizer adeus a todos. Era pedir demais ter uma infância normal?

“Eu poderia voltar para Oakville,” Sam disse de repente, interrompendo seus pensamentos. Sua última cidade. Era incrível como ele sempre sabia exatamente o que ela estava pensando. “Eu poderia ficar com amigos.”

O dia estava a afetando. Era simplesmente demais para ela. Ela não estava pensando claramente e, em sua frustração, o que ela estava ouvindo era que Sam estava se preparando para abandoná-la também, que ele não se importava mais com ela.

“Então vá!” ela explodiu de repente, sem querer. Era como se outra pessoa tivesse dito aquilo. Ela ouviu a dureza em sua própria voz, e se arrependeu imediatamente.

Por que ela tinha que dizer coisas como aquela? Por que ela não conseguia se controlar?

Se ela estivesse com um humor melhor, se ela estivesse mais calma e não tivesse que lidar com tanta coisa de uma só vez, ela não teria dito aquilo. Ou ela teria sido mais gentil. Ela teria dito algo do tipo, eu sei que o que você está tentando dizer é que nunca iria embora daqui, não importa o quanto as coisas ficassem ruins, porque você não iria me deixar sozinha para lidar com tudo isso. E eu amo você por isso. E eu também nunca abandonaria você. Nesta nossa infância problemática, pelo menos nós temos um ao outro. Em vez disso, o seu humor havia falado mais alto. Em vez disso, ela tinha sido egoísta, e explodido.

Ela sentou na cama e pôde ver a mágoa no rosto dele. Ela queria retirar o que disse, dizer que sentia muito, mas estava sobrecarregada demais. Por alguma razão, ela não conseguia abrir a boca.

No silêncio, Sam levantou lentamente da cadeira dela e saiu do quarto, fechando gentilmente a porta.

Idiota, ela pensou. Você é tão idiota. Por que você tem que tratá-lo do mesmo jeito que a mamãe trata você?

Ela deitou novamente, olhando para o teto. Ela entendeu que havia outra razão pela qual ela havia explodido. Ele havia interrompido os pensamentos dela, e ele o havia feito justamente quando eles estavam ficando piores. Um pensamento ruim havia cruzado pela sua mente, e ele a havia interrompido antes que ela tivesse uma chance de resolvê-lo.

O ex-namorado da sua mãe. Três meses atrás. Tinha sido a única vez que a mãe dela realmente parecia feliz. Frank, 50 anos. Baixinho, musculoso, perdendo cabelo. Robusto como um touro. Com cheiro de colônia barata. Ela tinha 16 anos.

Ela estava de pé na pequena lavanderia, dobrando suas roupas, quando Frank apareceu na porta. Ele era nojento, estava sempre olhando para ela. Ele se abaixou e pegou uma das calcinhas dela, e ela podia sentir suas bochechas corarem por vergonha e raiva. Ele a levantou e riu.

“Você deixou cair,” ele disse, rindo. Ela a puxou das mãos dele.

“O que você quer?” ela respondeu, irritada.

“Isso é jeito de falar com o seu novo padrasto?”

Ele avançou meio passo.

“Você não é meu padrasto.”

“Mas eu vou ser—em breve.”

Ela tentou voltar a dobrar suas roupas, mas ele avançou mais um passo. Perto demais. O coração dela pulava em seu peito.

“Eu acho que está na hora de nos conhecermos um pouco melhor,” ele havia dito, tirando o cinto da cintura. “Você não acha?”

Apavorada, ela tentou passar por ele e sair do pequeno cômodo, mas quando tentou, ele bloqueou sua passagem, a segurou com força e a jogou contra a parede.

Foi então que aquilo aconteceu.

Uma fúria a inundou. Uma fúria diferente de tudo o que ela havia experimentado. Ela sentiu seu corpo se aquecer, pegar fogo, dos dedos dos pés até o couro cabeludo. Quando ele se aproximou dela, ela pulou e o chutou, plantando os dois pés no meio do seu peito.

Apesar de ter um terço do tamanho dele, ele voou pela porta, quebrando a madeira das juntas, e continuou voando, 3 metros até o outro cômodo. Era como se uma bola de canhão o tivesse jogado pela casa.

Caitlin havia ficado parada lá, tremendo. Ela nunca tinha sido uma pessoa violenta, nunca tinha sequer dado um soco em alguém. Além disso, ela não era muito grande ou forte. Como ela tinha conseguido chutá-lo daquele jeito? Como ela tinha a força para fazer aquilo? Ela nunca tinha visto ninguém—muito menos um homem adulto—voar pelo ar, ou quebrar uma porta. De onde a força dela tinha vindo?

Ela caminhou até ele e parou ali.

Ele estava totalmente inconsciente, caído de costas. Ela se perguntou se havia o matado. Mas, naquele momento, com a raiva ainda dentro dela, ela não se importava. Ela estava mais preocupada consigo mesma, com quem—ou o quê—ela realmente era.

Ela nunca viu Frank novamente. Ele terminou o namoro com a mãe dela no dia seguinte, e nunca mais voltou. Sua mãe havia suspeitado que algo tivesse acontecido entre os dois, mas nunca disse nada. No entanto, ela culpou Caitlin pelo fim do namoro, por estragar o único momento de felicidade em sua vida. E ela não havia deixado de culpá-la desde então.

Caitlin voltou a olhar para o seu teto descascado, o coração batendo forte novamente. Ela pensou na raiva de hoje, e se perguntou se os dois episódios estavam ligados. Ela sempre havia acreditado que Frank tinha sido apenas um incidente estranho e isolado, alguma explosão estranha de força. Mas agora, ela se perguntava se aquilo era algo mais. Existia algum tipo de poder dentro dela? Ela era algum tipo de aberração?

Quem era ela?

Capítulo Três

Caitlin correu. Seus agressores estavam de volta, e a perseguiam pelo beco. Uma rua sem saída estava em sua frente, um enorme muro, mas ela correu de qualquer jeito, direto naquela direção. Conforme corria, ela ganhou velocidade, uma velocidade impossível, e os prédios passaram por ela como um borrão. Ela conseguia sentir o vento em seu cabelo.

Quando chegou mais perto, ela pulou e, em um único salto, estava no topo do muro, a nove metros de altura. Mais um salto, e ela voou pelo ar novamente, nove metros, seis metros, caindo no concreto sem perder o ritmo, ainda correndo, correndo. Ela se sentiu poderosa, invencível. Sua velocidade aumentava mais e mais, e ela sentiu que podia voar.

Ela olhou para baixo e, diante dos seus olhos, o concreto virou grama—grama alta, verde e balançando. Ela correu por uma campina, o sol brilhando, e reconheceu o lugar como a casa de sua primeira infância.

Na distância, ela podia sentir que seu pai estava lá, de pé, no horizonte. Enquanto corria, ela sentia que estava chegando mais perto dele. A imagem dele começou a ficar mais clara. Ele estava lá, com um sorriso largo e os braços abertos.

Ela ansiava por vê-lo novamente. Ela correu o máximo que pode. Mas sempre que chegava mais perto, ele se distanciava.

De repente, ela estava caindo.

Uma grande porta medieval se abriu, e ela entrou em uma igreja. Ela caminhou pelo corredor pouco iluminado, tochas queimando em ambos os lados. Na frente de um altar, estava um homem de costas para ela, ajoelhado. Quando ela chegou mais perto, ele se levantou e se virou.

Era um padre. Ele olhou para ela, e seu rosto se encheu de medo. Ela sentiu seu sangue correndo em suas veias, e viu a si mesma se aproximar dele, sem poder parar. Ele levantou uma cruz, com medo.

Ela se lançou sobre ele. Ela sentiu seus dentes ficarem longos, longos demais, e assistiu enquanto eles perfuravam o pescoço do padre.

Ele gritou, mas ela não se importou. Ela sentiu o sangue dele correr pelos seus dentes e para dentro de suas veias, e aquela foi a sensação mais incrível da sua vida.

Caitlin se sentou na cama, ofegante. Ela olhou ao seu redor, desorientada. A forte luz do sol entrava.

Finalmente, ela percebeu que estava sonhando. Ela secou o suor frio da testa e sentou na beira na cama.

 

Silêncio. Julgando pela luz, Sam e a mãe dela já deviam ter saído. Ela olhou para o relógio e viu que realmente era tarde: 8h15. Ela iria se atrasar para o seu segundo dia de aula.

Perfeito.

Ela estava surpresa por Sam não tê-la acordado. Todos aqueles anos, ele nunca a havia deixado dormir demais—ele sempre a acordava se estivesse saindo antes.

Ele ainda deve estar bravo com o que aconteceu ontem à noite.

Ela olhou para o seu telefone: sem bateria. Ela havia esquecido de carregá-lo. Não havia problema. Ela não estava a fim de conversar com ninguém.

Ela vestiu algumas roupas do chão e passou a mão no cabelo. Normalmente, ela saía sem comer nada, mas nessa manhã, ela sentiu sede. Ela foi até o refrigerador e pegou uma garrafa de 2 litros de suco de grapefruit. Em um frenesi repentino, ela arrancou a tampa e bebeu o suco direto da garrafa. Ela não parou de beber até que tivesse tomado os 2 litros inteiros.

Ela olhou para a garrafa vazia. Ela realmente tinha acabado de beber tudo aquilo? Em toda a sua vida, ela nunca havia bebido mais do que meio copo. Ela viu a si mesma pegar e amassar a garrafa com uma única mão, até formar uma pequena bola. Ela não conseguia entender o que era aquela nova força que corria em suas veias. Era excitante. E apavorante.

Ela ainda estava com sede. E com fome. Mas não de comida. Suas veias pediam algo mais, mas ela não conseguia entender o quê.

*

Era estranho ver os corredores da sua escola tão vazios, o completo oposto do dia anterior. Com as aulas em andamento, não havia ninguém por perto. Ela olhou para o relógio: 8h40. Faltavam 15 minutos para a sua terceira aula do dia. Ela se perguntou se valia à pena ir à aula, mas afinal, ela não conhecia nenhum outro lugar para ir. Então, ela seguiu os números dos corredores até a sua sala.

Ela parou do lado de fora da sala de aula, e podia ouvir a voz da professora. Ela hesitou. Ela odiava interromper, ficar tão visível. Mas ela não via nenhuma outra opção.

Ela respirou fundo e girou a maçaneta de metal.

Ela entrou, e a turma inteira parou e olhou para ela. Inclusive a professora.

Silêncio.

“Srta. ...” A professora, esquecendo o nome dela, foi até a sua mesa e pegou um pedaço de papel, examinando-o, “...Paine. A nova aluna. Você está 25 minutos atrasada.”

Uma austera mulher mais velha, a professora olhou para Caitlin.

“O que você tem a dizer sobre isso?”

Caitlin hesitou.

“Desculpe?”

“Isso não é o suficiente. Chegar atrasada na aula pode ser algo aceitável de onde você vem, mas certamente não é aceitável aqui.”

“Inaceitável,” Caitlin disse, e imediatamente se arrependeu.

Um silêncio desconfortável cobriu a sala.

“Como é?” a professora perguntou, lentamente.

“Você disse ‘não é aceitável.’ Você quis dizer ‘inaceitável.’”

“OH—MERDA!” exclamou um garoto barulhento do fundo da sala, e a turma inteira explodiu em risos.

O rosto da professora ficou um vermelho vivo.

“Sua fedelha. Vá para a sala do diretor agora mesmo!”

A professora foi até a porta e a abriu para Caitlin. Ela ficou à alguns centímetros de distância, perto o suficiente para que Caitlin conseguisse sentir o cheiro do seu perfume barato. “Fora da minha sala!”

Normalmente, Caitlin teria saído silenciosamente da sala, cabisbaixa—na verdade, ela nunca teria corrigido um professor. Mas algo havia mudado dentro dela, algo que ela não entendia muito bem, e ela sentiu uma rebeldia crescendo. Ela não sentia que precisava mostrar respeito por ninguém. E ela não sentia mais medo.

Em vez disso, Caitlin ficou onde estava, ignorando a professora, e examinou a sala lentamente, procurando por Jonah. A sala estava cheia, e ela havia procurado em todas as fileiras. Nenhum sinal dele.

“Srta. Paine! Você não ouviu o que eu disse!?”

Caitlin olhou para ela com um ar desafiador. Então ela se virou e saiu da sala lentamente.

Ela pôde sentir a porta bater atrás dela, e depois ouviu o falatório abafado na sala, seguido por, “Fiquem quietos, todos!”

Caitlin continuou a caminhar pelo corredor vazio, vagando, sem saber com certeza para onde estava indo.

Ela ouviu passos. À distância, um guarda de segurança apareceu. Ele caminhou na direção dela.

“Passe!” ele gritou para ela, ainda a uns 6 metros de distância.

“O quê?” ela respondeu.

Ele se aproximou.

“Onde está o seu passe de corredor? Você deve carregá-lo em um lugar visível o tempo todo.”

“Que passe?”

Ele parou e a examinou. Ele era um homem feio, com cara de mau e uma enorme pinta da testa.

“Você não pode caminhar pelos corredores sem um passe assinado. Você sabe disso. Onde ele está?”

“Eu não sabia—”

Ele pegou seu walkie-talkie e disse, “Violação de passe de corredor na ala 14. Eu vou levá-la para a detenção agora.”

“Detenção?” Caitlin perguntou, confusa. “Do que você está—”

Ele agarrou o seu braço com força e a arrastou pelo corredor.

“Nem mais uma palavra!” ele retrucou.

Caitlin não gostava de sentir os dedos dele apertando seu braço, arrastando-a como se ela fosse uma criança. Ela podia sentir o calor crescendo em seu corpo. Ela sentiu a Raiva chegando. Ela não sabia bem como, ou por que, mas ela sabia. E ela sabia que, em alguns momentos, ela não seria capaz de controlar sua raiva—ou o seu uso de força.

Ela tinha que parar aquilo antes que fosse tarde demais. Ela usou toda a força de vontade que tinha para fazer aquilo parar. Mas, enquanto os dedos dele estivessem nela, a raiva não iria embora.

Ela puxou o braço rapidamente, antes que a força total tomasse conta dela, e viu quando a mão dele voou para longe dela, e ele caiu para trás.

Ele olhou para ela, chocado em ver que uma garota do tamanho dela havia conseguido jogá-lo tão longe com apenas uma puxada de seu braço. Ele vacilou entre a indignação e o medo. Ela podia vê-lo perguntando a si mesmo se devia atacá-la ou recuar. Ele abaixou sua mão até o cinto, onde um grande frasco de spray de pimenta estava pendurado.

“Coloque as suas mãos em mim de novo, jovenzinha,” ele disse com uma raiva fria, “e eu vou usar o spray em você.”

“Então não coloque as suas mãos em mim,” ela respondeu, desafiadora. Ela estava chocada com o som da sua própria voz. Ela havia mudado. Estava mais grave, mais primitiva.

Ele tirou lentamente a mão do spray. Ele cedeu.

“Caminhe na minha frente,” ele disse. “Até o fim do corredor e subindo as escadas.”

*

O guarda a deixou na entrada lotada da sala do diretor, e quando ele o fez, seu rádio o chamou e ele correu para outro lugar. Antes de ir, ele se virou para ela.

“Não quero ver você nesses corredores novamente,” ele disse, zangado.

Caitlin se virou e viu 15 garotos, de todas as idades, sentados, em pé, todos aparentemente esperando para ver o diretor. Todos eles pareciam desajustados. Eles estavam sendo processados, um aluno por vez. Um guarda estava presente, mas apático, cochilando em pé.

Caitlin não estava disposta a esperar o dia inteiro, e ela certamente não queria conhecer o diretor. Ela não deveria ter chegado atrasada para a escola, é verdade, mas não merecia isso. Aquilo já era o suficiente.

A porta do corredor abriu e um guarda trouxe mais três garotos, brigando e empurrando. Uma confusão começou na pequena área de espera, que estava completamente lotada. O sino tocou e, além das portas de vidro, ela podia ver o corredor se enchendo. Agora, havia confusão dentro e fora da sala.

Caitlin viu a sua chance. Quando a porta se abriu novamente, ela se escondeu atrás de outro garoto e saiu para o corredor.

Ela olhou rapidamente para trás, mas não viu ninguém. Ela passou rapidamente pela multidão de garotos, chegando ao outro lado e fazendo a curva. Ela olhou novamente: ainda não havia ninguém vindo.

Ela estava segura. Mesmo que os guardas percebessem sua ausência—o que ela duvidava, já que não chegou a ser processada—ela já estaria longe demais para alcançar. Ela caminhou ainda mais rápido pelo corredor, aumentando a distância entre eles, e foi em direção à cantina. Ela precisava encontrar Jonah. Ela tinha que saber se ele estava bem.

A cantina estava lotada, e ela caminhou rapidamente entre as fileiras, procurando por ele. Nada. Ela caminhou uma segunda vez, examinando cada mesa lentamente, e mesmo assim não conseguiu encontrá-lo.