A próxima porta

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CAPÍTULO CINCO

Danielle estava no sofá, encostada em Martin, com as pernas sobre as dele, e sabia que não estava vestindo uma calcinha por baixo do pijama. Não que importasse. De certo modo, ele havia a rejeitado na noite anterior, mesmo sem sutiã e com a calcinha provocante. Parecia que Martin estava levando mesmo a sério a questão de levar as coisas com calma.

Ela estava começando a pensar que ou ele estava sendo cavalheiro, ou não se sentia sexualmente atraído por ela. Na última opção, no entanto, era difícil de acreditar, porque ela sentira literalmente a prova da atração dele apertando suas pernas e quadril em várias oportunidades.

Tentou não se incomodar com aquilo. Mesmo que estivesse de fato sexualmente frustrada, havia algo especial em finalmente ter encontrado um homem que queria mais do que apenas sexo.

Aquela noite era um ótimo exemplo. Eles havia escolhido ficar em casa, sentados no apartamento dela, assistindo a um filme. Antes, haviam conversado sobre o dia de Martin. Ele era gerente auxiliar em uma gráfica, e havia vários detalhes para discutir. Era como escutar alguém explicar sobre como a tinta seca. Já Danielle odiava falar sobre seu dia. Enquanto garçonete em um restaurante local, seus dias eram um tédio. Ela ficava sentada lendo a maioria do tempo. As noites eram preenchidas com histórias que poderia compartilhar, mas quando pegava no sono e acordava, ela não queria mais falar sobre elas.

Depois da conversa, eles haviam se beijado um pouco, mas tudo muito normal. Novamente, Danielle percebeu que estava bem com a situação. Além disso, desde a visita de Chloe, ela andava chateada. As pílulas nem chegavam a fazer efeito até ela tomar a segunda antes de ir para a cama.

Graças à visita de Chloe, Danielle estivera pensando na mãe, no pai, e na infância que havia passado para ela como um lampejo. Na verdade, ela só queria ser abraçada por Martin—algo que a fazia sentir dor ao admitir para si mesma.

Eles colocaram um dos DVDs, escolhendo The Shawshank Redemption e deitando juntos no sofá como duas crianças nervosas e inexperientes na época da escola. Algumas vezes, a mão dele escorregava para baixo dos ombros, e ela tentava imaginar se ele estava tentando fazer algo. Mas ele se mantinha respeitoso, algo bom e irritante ao mesmo tempo.

Danielle também percebeu que, às vezes, o telefone dele vibrava. Ele estava em cima da mesa de café, na frente deles, mas ele decidira não olhar. Primeiro, ela pensou que ele só estava sendo educado, sem desrespeitar o encontro. Mas depois de algum tempo—quando Danielle pensava ter escutado o celular sete ou oito vezes—aquilo começara a ficar desagradável.

Quando Tim Robbins trancou-se no escritório do diretor e tocou ópera para os prisioneiros de Shawshank, o telefone tocou mais uma vez. Danielle olhou para o aparelho, e depois para Martin.

- Você vai ver o que é? – Ela perguntou. – Alguém está precisando muito de você.

- Não, está tudo bem – ele disse. Ele trouxe ela para mais perto e a puxou. Os dois deitaram lado a lado. Se ela quisesse, poderia facilmente beijar o pescoço dele. Olhou em volta e pensou. Imaginou como ele reagiria se ela o beijasse ali, talvez correndo a língua com jeito pelo pescoço dele.

O telefone tocou novamente. Danielle deu uma risadinha e, sem dizer nada, levantou-se do peito de Martin. Ela pegou o telefone e trouxe até seu peito. Olhando para a tela bloqueada, disse:

- Qual é sua sen—

Martin tirou o telefone com violência da mão dela. Ele parecia mais surpreso do que furioso.

- O que foi isso? – Ele perguntou.

- Nada – ela disse. – Só brincando. Você pode ver seu telefone quando estiver comigo. Eu não me importo. Mas se for outra namorada eu vou ter que usar minhas garras nela.

- Eu não preciso que você supervisione meu celular – ele disse.

- Ei, espere aí. Não precisa ficar bravo. Eu só estava brincando.

Ele riu da cara dela e colocou o telefone no bolso. Depois, suspirou e sentou-se, aparentemente sem querer mais ficar deitado com ela.

- Ah, você é desses, então - ela disse, ainda tentando encontrar um equilíbrio entre brincar e ser persistente. – Guarda o telefone como se fosse seu pau ou algo assim.

- Esquece isso – ele disse. – Não seja estranha.

- Eu? Martin, achei que você ia quebrar meu pulso tirando o celular da minha mão.

- Bom, não é seu telefone, é? Você confia em mim?

- Não sei – ela disse, levantando a voz. – Não estamos saindo há tanto tempo. Cara, não precisa ficar tanto na defensiva.

Ele virou os olhos e olhou para a TV. Um gesto mal educado, que a irritou. Danielle balançou a cabeça e, fazendo o possível para manter uma expressão agradável, rapidamente montou nele. Abaixou-se como se fosse em direção ao zíper, mas depois virou-se para o bolso no qual estava o telefone. Com a outra mão, começou a fazer cócegas no lado direito dele.

Martin foi pego de surpresa, claramente sem saber como reagir. Ainda assim, quando os dedos dela tocaram no telefone, ele pareceu ter sido ligado na tomada. Pegou o braço dela e puxou com força. Depois, jogou-a no sofá, sem largar o braço. Doeu muito, mas ela não queria que ele a ouvisse gritando de dor. A velocidade e força dele a fizeram lembrar que ele já havia sido um boxeador amador.

- Cacete, solte a porra do meu braço!

Ele soltou, olhando para ela, surpreso. O olhar em seu rosto a fez pensar que ele não queria ter sido tão bruto. Ele surpreendera a si mesmo. Mas Martin também estava bravo. A sobrancelha apertada e os ombros tremendo eram evidências disso.

- Estou indo – ele disse.

- Isso, boa ideia – Danielle respondeu. – E nem precisa me ligar mais se não for para pedir desculpas.

Ele balançou a cabeça—se concordando consigo mesmo ou com ela, Danielle não sabia. Ela o viu sair rapidamente pela porta, fechando-a com força. Danielle sentou-se no sofá, olhando para a porta por algum tempo e tentando entender o que exatamente havia acontecido.

Não quer transar comigo e tem um comportamento desses, pensou. Esse cara pode ser problemático demais para valer a pena.

Claramente, ela sempre se sentia atraída por aquele tipo de homem.

Danielle olhou para seu braço e viu marcas vermelhas onde ele havia a segurado. Ela tinha certeza de que ele havia a machucado. Não era a primeira vez que um cara usava a força com ela, mas ela não imaginava aquilo vindo de Martin.

Brincou com a ideia de ir atrás dele para entender o que havia acontecido. Mas, ao invés disso, ficou no sofá e assistiu ao filme. Se o passado lhe ensinara algo, era que simplesmente não valia a pena correr atrás de homens. Nem daqueles que pareciam bons demais para serem de verdade.

Ela terminou o filme sozinha e encerrou a noite. Quando apagou a luz, sentiu que estava sendo vigiada—como se não estivesse sozinha. Sabia que aquilo era ridículo, é claro, mas não pode deixar de olhar para a porta, onde a carta havia aparecido no dia anterior—e várias vezes antes—vindas do nada.

Continuou no sofá e olhando para a porta, quase esperando que outra carta aparecesse. E vinte minutos depois, quando levantou-se para começar a se arrumar para trabalhar, acendeu todas as luzes do apartamento.

Devagar, uma paranoia esquisita tomou conta dela. Algo familiar, um sentimento que era como um amigo íntimo de anos—um amigo muito íntimo desde que as cartas começaram a chegar.

Pensou nas pílulas e, por um momento, passou por tudo o que estava em sua cabeça. Tudo. Inclusive as cartas.

Aquilo era tudo real?

Danielle não pode deixar de pensar no passado, lembrando-se da escuridão da qual ela achou que já havia escapado.

Ela estava perdendo a cabeça novamente?

CAPÍTULO SEIS

Chloe estava sentada na sala de espera, olhando para as revistas na mesa do café. Ela já havia visitado dois psicólogos diferentes depois da morte da mãe, mas não havia entendido de fato o propósito das consultas. Agora, no entanto, aos vinte e sete anos, ela sabia porque estava ali. Aceitara o conselho de Greene e ligara para o psicólogo do FBI para falar sobre sua reação à cena do crime do dia anterior. Naquele momento, estava tentando relembrar os consultórios que visitara na infância.

- Senhorita Fine? – Uma mulher chamou do outro lado da sala.

Chloe estava tão longe em seus pensamentos que não ouviu a porta da sala de espera. Uma mulher bem apessoada acenou para ela. Chloe levantou-se e fez o possível para não parecer derrotada enquanto seguia a mulher pelo corredor até o grande consultório.

Ela pensou no que Greene havia dito no dia anterior, enquanto tomavam café. Aquilo ainda estava forte em sua mente, porque fora o primeiro conselho realmente útil de um agente durante o começo de sua carreira.

Visitei esse psicólogo várias vezes na minha vida. Meu quarto caso foi um assassinato com suicídio. Quatro corpos. Um era uma criança de três anos. Acabou comigo. Então posso te falar com certeza... isso funciona. Especialmente se você começar desde já. Já vi agentes que se achavam fodas e que não precisavam de ajuda. Não seja um desses, Fine.

Então, não... precisar de psicólogo não fazia dela um fracasso. E melhor, ela esperava que aquilo pudesse torná-la mais forte.

Chloe entrou no consultório e viu um senhor de aproximadamente sessenta anos sentado atrás de uma mesa grande. Uma janela atrás da mesa mostrava uma pequena topiaria lá fora, e borboletas voando para lá e para cá. O nome dele era Donald Skinner, e ele já exercia a profissão há mais de trinta anos. Ela sabia disso porque havia pesquisado sobre ele no Google antes de decidir ir à consulta. Skinner era muito formal e educado. Ele pareceu preencher a sala um pouco mais quando caminhou em direção a ela para lhe cumprimentar.

 

Ele acenou em direção a uma confortável cadeira no meio da sala.

- Por favor - disse. – Sinta-se à vontade.

Chloe sentou-se, claramente nervosa. Ela sabia que provavelmente estava forçando muito para tentar esconder esse sentimento.

- Já fez isso antes? – Skinner perguntou.

- Quando era muito mais nova – ela disse.

Ele assentiu e sentou-se em uma cadeira idêntica, em frente a ela. Quando se acomodou, colocou o joelho direito por cima da perna e colocou as mãos sobre ele.

- Senhorita Fine, por que você não me fala sobre você... e depois sobre o motivo de você estar aqui hoje.

- Sobre mim desde quando? – Ela perguntou, em tom de brincadeira.

- Por enquanto, foque na cena do crime de ontem – Skinner respondeu.

Chloe pensou por um momento e depois começou. Ela não escondeu nada, inclusive falando um pouco de seu passado para ele. Skinner escutou atentamente, ponderando sobre tudo o que estava sendo dito.

- Me diga – Skinner disse. – Até agora, das cenas de crime que você presenciou, essa foi a mais macabra?

- Não. Mas foi a coisa mais macabra que me deixaram ver de verdade.

- Então você está propensa a admitir completamente que foi o que aconteceu no seu passado que fez você reagir daquele jeito?

- Acho que sim. Digo, nunca tinha acontecido antes. E mesmo quando isso tenta me incomodar, eu consigo deixar para lá facilmente.

- Entendi. Mas há outros fatores que podem ter ajudado nisso? Uma nova cidade, um novo instrutor, uma nova casa. Várias mudanças...

- Minha irmã gêmea – Chloe disse. – Ela mora aqui em Pinecrest. Pensei em talvez vê-la de novo depois de um ano... talvez isso, junto com a cena que eu vi ter sido tão parecida.

- Esse pode muito bem ter sido o motivo – Skinner disse. – Por favor, desculpe por perguntar algo tão simples, mas foi a morte de sua mãe que levou você a querer fazer uma carreira no FBI?

- Sim. Eu sabia, quando tinha 12 anos, que era isso que eu queria fazer.

- E sua irmã? O que ela faz?

- Ela é garçonete em um bar. Acho que ela gosta porque precisa ser sociável só algumas horas, e depois pode ir para casa e dormir até meio dia.

- E ela lembra daquele dia como você? Vocês já conversaram sobre isso?

- Sim, mas ela não entra muito em detalhes. Quando eu tento, ela me interrompe rapidamente.

- Então entre em detalhes comigo agora - Skinner disse. – Claramente você precisa falar sobre isso. Então porque não comigo... alguém imparcial?

- Bem, como eu disse antes, pareceu um acidente muito simples, porém infeliz.

- Mas seu pai foi preso – Skinner apontou. – Então, para mim, como alguém que não conhece o caso, eu não veria como um acidente. Fico curioso em saber como você enxerga isso como acidente tão claramente. Mas vamos passar adiante. O que aconteceu aquele dia? Do que você lembra?

- Bom, foi um acidente causado pelo meu pai. Por isso ele foi preso. Ele nem mentiu. Ele estava bêbado. Minha mãe o irritou, e ele a empurrou.

- Estou te dando a chance de falar em detalhes e é só isso o que você me conta? – Skinner perguntou em um tom amigável.

- Uma parte da história está borrada na minha cabeça – Chloe admitiu. – Você sabe, do jeito que memórias do passado ficam embaçadas na mente.

- Certo. Então... Quero tentar algo com você. Já que é a primeira vez que nos encontramos, não vou tentar hipnose. Mas vou tentar uma forma comprovada de terapia. Algo que chamamos de terapia da linha do tempo. Para hoje, acho que o que pode ajudar é ir mais a fundo nos detalhes daquele dia—detalhes que estão aí na sua mente, mas de certa forma trancados, porque você tem medo de encará-los. Se você continuar me visitando, essa terapia vai acabar nos ajudando a acabar com esse medo e ansiedade que você sente sempre que pensa naquele dia. O que você acha? Parece bom para você?

- Sim - ela disse sem hesitar.

- Certo, muito bom. Então... vamos começar por onde você estava sentada. Quero que você feche os olhos e relaxe. Tire alguns segundos para clarear a mente e ficar confortável. Balance de leve a cabeça quando estiver pronta.

Chloe fez o que ele pediu. Ela permitiu-se afundar na cadeira. Era uma cadeira muito confortável, de couro. Sentiu que ainda estava com os ombros tensos, desconfortável por estar sendo tão vulnerável na frente de alguém que sequer conhecia. Ela suspirou fundo e relaxou os ombros. Acomodou-se na cadeira e escutou o barulho do ar condicionado. Escutou o ruído e assentiu. Ela estava pronta.

- Certo – Skinner disse. – Na varanda com sua irmã. Agora, mesmo que você não lembre o tipo de calçado que estava usando naquele dia, quero que você imagine que está olhando para seus pés. Olhando para baixo, para os seus calçados. Quero que você foque neles e nada mais—apenas o calçado que você estava usando quando tinha dez anos. Você e sua irmã na varanda. Mas mantenha seus olhos só nos calçados. Descreva-os para mim.

- Chuck Taylors – Chloe disse. Vermelhos. Baixos. Cadarços grandes.

- Perfeito. Agora veja os cadarços. Preste atenção só neles. Quero que você, aos dez anos, levante sem tirar o olho deles. Quero que você levante e caminhe até onde você tinha encontrado o sangue no chão, no fim da escada. Quero que você volte algumas horas. Mas não tire os olhos do cadarço. Você consegue?

Chloe sabia que não estava hipnotizada, mas as instruções pareciam simples. Básicas e fáceis. Ela levantou, dentro de sua mente, e caminhou para dentro do apartamento. Ao chegar lá, viu o sangue, viu sua mãe.

- Minha mãe está aqui no fim da escada – ela disse. – Tem muito sangue. Danielle está chorando em algum lugar. Meu pai está andando de um lado para outro.

- Certo. Mas olhe só para os cadarços – Skinner instruiu. – E veja se você consegue voltar mais ainda. Você pode tentar?

- Sim, fácil. Estou com Beth... uma amiga. Voltamos do cinema. A mãe dela nos levou. Me deixou em casa e ficou na calçada até eu entrar. Ela sempre fazia isso, nunca ia embora antes de me ver entrar.

- Certo. Olhe para o cadarço quando você sai do carro e sobe as escadas. Depois, me conte sobre o resto da tarde.

- Eu entrei no prédio e depois fui para o segundo andar, no nosso apartamento. Quando eu coloquei a chave na porta para abrir, escutei o pai lá dentro. Então entrei. Fechei a porta para ir até a sala, mas vi o corpo da mãe. No fim da escada. O braço direito dela estava preso embaixo do corpo. O nariz parecia destruído e tinha sangue por tudo. A maioria do rosto estava coberto de sangue. No tapete inteiro, no final da escada. Acho que meu pai pode ter tentado mexer no corpo...

Chloe parou ali. Ela estava achando difícil focar apenas nos cadarços velhos. Ela conhecia a cena que estava descrevendo muito bem para ignorá-la.

- Danielle está em pé ali, do lado dela. Tem sangue nas mãos e nas roupas. O pai está falando muito alto no telefone, falando para alguém vir rápido, houve um acidente. Quando ele sai, ele olha para mim e começa a chorar. Ele jogou o telefone pela sala, bateu contra a parede. Ele veio até nós e se abaixou. Pediu desculpas... disse que a ambulância estava a caminho. Depois olhou para Danielle e nós quase não entendemos o que ele disse sob as lágrimas. Ele disse que Danielle precisava subir e trocar de roupa.

Ela foi e eu a segui. Perguntei para ela o que tinha acontecido, mas ela não falava comigo. Ela nem chorava. De repente, começamos a ouvir sirenes. Ficamos ali com o pai, esperando que ele nos dissesse o que ia acontecer depois. Mas ele nunca disse. A ambulância chegou, depois a polícia. Um policial amigo nos levou para fora, na varanda, e ficou ali com a gente até meu pai sair algemado. Até eles tirarem o corpo da mãe...

De repente, a imagem dos cadarços havia desaparecido. Ela estava de volta na varanda, esperando pela avó. O policial gordo estava com ela, e mesmo que não o conhecesse, ele a fazia sentir-se segura.

- Você está bem? – Skinner perguntou.

- Sim – ela disse, com um sorriso nervoso. – A parte do meu pai jogando o telefone... Eu tinha esquecido completamente disso.

- E lembrar disso fez você se sentir como?

Era uma pergunta difícil de responder. Seu pai sempre teve um temperamento forte, mas vê-lo fazendo aquilo depois o que aconteceu com sua mãe quase o fazia parecer fraco e vulnerável.

- Me fez ficar triste por ele.

- Você chegou a culpá-lo pela morte da sua mãe desde que isso aconteceu? – Skinner perguntou.

- Honestamente, depende do dia. Depende do meu humor.

Skinner assentiu e saiu de sua postura estátua. Ele levantou e olhou para baixo, para Chloe, com um sorriso tranquilizador.

- Acho que está bom por hoje. Por favor, me ligue se você tiver algum tipo de reação a alguma cena de crime de novo. E eu gostaria de te ver novamente logo. Podemos marcar uma consulta?

Chloe pensou naquilo e assentiu.

- Podemos, mas meu casamento está chegando, e temos reuniões com decoradora, buffet... é um saco. Posso ligar quando tiver um dia disponível?

- Claro. E até lá... fique perto do Agente Greene. Ele é um cara do bem. E foi muito direto comigo. Por favor, saiba que, nesse ponto da sua carreira, precisar conversar com alguém como eu não é nada ruim. Não tem nada a ver com seu talento.

Chloe assentiu. Ela sabia disso, mas era bom escutar Skinner dizer. Ela levantou-se e o agradeceu. Ao sair pela porta e entrar na sala de espera, viu seu pai jogando o telefone. Mas depois, ele fez um comentário—algo que ela não tinha esquecido, mas que passara despercebido até hoje.

Ele olhara para Danielle e, com um pouco de urgência na voz, dissera: Danielle, meu amor... troque de roupa. Não temos muito tempo até eles chegarem.

Aquele comentário ficou na mente de Chloe durante boa parte da tarde, atormentando-a e fazendo-a bater em uma porta na qual ela tinha evitado bater pelos últimos dezessete anos.

CAPÍTULO SETE

Danielle acordou às oito em ponto, sentindo-se como se não tivesse dormido nada. Ela havia chegado do trabalho às 2:45 e caído na cama às 3:10. Geralmente, não tinha problemas para dormir até as onze—às vezes até mais—mas quando abriu os olhos às 08:01 da manhã, não conseguiu voltar a dormir. Na verdade, ela não estava dormindo bem desde que soubera que Chloe estava voltando para a cidade. Sentia que seu passado estava a seguindo, e não pararia até destruí-la completamente.

Cansada e irritada, Danielle tomou um banho e comeu seu café da manhã. Fez tudo isso escutando o álbum Too Dark Park, de Skinny Puppy. Ao colocar a louça do café na pia, percebeu que precisaria ir ao mercado naquele dia. Na maioria das vezes, isso não a incomodava. Mas havia dias em que ela sentia que sair em público era um erro... que as pessoas estavam a olhando, esperando por ela para foder com sua vida e apontar dedos.

Ela também tinha medo de sair e permitir que o autor das cartas a seguisse. Num dia desses, pensou, o autor poderia parar de brincar e simplesmente matá-la.

Talvez aquele fosse o dia.

Ela dirigiu até o mercado, totalmente consciente de que aquele seria um desses dias... daqueles onde ela teria medo de tudo. Um desses dias onde ela ficaria olhando sempre por cima dos ombros. Dirigiu rapidamente, passando até por um sinal vermelho, querendo chegar logo.

Desde que começara a receber os bilhetes perturbadores debaixo da porta, Danielle sentia-se ansiosa ao ficar em lugares públicos por muito tempo. Era muito fácil imaginar que a pessoa que estava escrevendo as cartas estava a seguindo. Mesmo no trabalho, ela imaginava que o autor poderia estar sentado no bar, recebendo drinks dela. Quando pegava comida chinesa, imaginou que ele poderia estar a seguindo, esperando para finalmente pegá-la quando ela voltasse para o carro. Será?

Mesmo depois de chegar em segurança até seu destino, correndo até o mercado e praticamente correndo com o carrinho pelos corredores, o medo estava presente. O autor das cartas poderia estar ali com ela, seguindo seus passos a alguma distância, talvez olhando de longe, ou através da prateleira de cereais.

Era um medo real, que passava por sua cabeça, um dia depois do que acontecera com Martin. A paranoia não lhe deixava, fazendo-a abaixar a cabeça e encolher os ombros. Se alguém quisesse ver seu rosto, precisaria de um motivo muito bom, a ponto de fazê-la parar e levantar a cabeça.

 

Ela odiava que fosse assim. Sempre enfrentara esse tipo de problemas, e era por isso que a maioria de seus relacionamentos raramente duravam mais do que um mês. Ela sabia que havia construído uma reputação de ser um pouco vadia durante sua primeira passagem por Pinecrest, mas não porque ela gostava de dormir por aí. Era porque, quando conseguia se sentir confortável o suficiente para dormir com um cara, começava a pensar o pior dele. Terminava o relacionamento, tirava um tempo para se recuperar, e começava tudo de novo.

Ela havia melhorado um pouco quando se mudara novamente para Pinecrest, alguns anos antes. Deixara Boston e sentira que estava dando um passo atrás... mas tudo bem. Pelo menos, estava voltando para algo familiar. O mais difícil era se acostumar ao cenário estagnado de namoros. No começo, estava tudo bem, mesmo que estragando todas as relações que começava. Por isso a briga com Martin não saía de sua cabeça.

Claro, havia o lado ruim de Pinecrest. Muitas pessoas lembravam-se dela e de Chloe. Eles lembravam das pobres garotinhas Fine, que acabaram morando com os avós depois que a mãe morreu e o pai foi preso.

- Danielle, é você?

Ela virou-se em direção à voz, assustada. Estava tão perdida em seus pensamentos que expusera o rosto completamente para pegar uma caixa de Froot Loops. Encontrou-se olhando para um rosto do passado—uma mulher que parecia terrivelmente familiar, mas da qual ela não conseguia se lembrar.

- Você não lembra de mim? – A mulher perguntou, sem saber se estava ofendida ou achando graça. Ela provavelmente tinha cerca de quarenta e cinco, talvez cinquenta anos. E não, Danielle não se lembrava dela.

- Acho que você não lembra mesmo – a mulher disse. – Acho que você tinha treze ou quatorze anos da última vez que te vi. Eu sou Tammy Wiler. Eu era amiga da sua mãe.

- Ah, claro – Danielle disse. Ela não lembrava da mulher, mas o nome era familiar. Danielle imaginou que fosse uma das amigas da família, que a visitara nos anos seguintes à morte da mãe.

- Eu quase não te reconheci – Tammy disse. – Seu cabelo está... mais escuro.

- Sim – Danielle disse sem entusiasmo. Ela supôs que na última vez que na Tammy Wyler havia a encontrado, ela deveria estar apenas entrando no seu modo rebelde. Na época, treze ou quatorze anos atrás, ela geralmente colocava listras de rosa neon no cabelo. Agora, ele era preto, totalmente, um estilo antigo, mas que ela achava que combinava perfeitamente consigo.

- Eu sempre soube que você voltaria para cá, mas bem... não sei. Eu nunca soube muita coisa de você depois que você se mudou. Você foi para Boston ou algo assim por um tempo, certo?

- Certo.

- Ah, e eu soube que Chloe voltou, também. Comprou uma casa nova perto de Lavender Hills, certo?

- Sim, ela voltou - Danielle disse, chegando perto de extrapolar sua tolerância para conversas bobas.

- Soube por aí que ela mora a só duas casas de uma menina com quem vocês estudavam no ensino médio. Na verdade eu moro umas duas ruas depois dela.

Pobre Chloe, Danielle pensou.

- Ah, ela te falou sobre a festa no bairro? – Tammy perguntou, aparentemente sem conseguir parar de falar por mais de três segundos.

- Falou, sim – Danielle disse. Ela esperava que Tammy entendesse suas respostas curtas como uma dica de que ela não era do tipo que ficava conversando no corredor do mercado.

Houve um breve silêncio entre as duas e Tammy pareceu mesmo perceber a situação. Ela olhou em volta, de um jeito estranho, e disse com o melhor tom possível:

- Bem, espero que você possa ir. Bom te ver, Danielle.

- Sim, você também. – Danielle disse.

Ela não perdeu tempo em abaixar os ombros e a cabeça e empurrar o carrinho até a prateleira dos cereais. A necessidade de sair dali e voltar para o apartamento estava mais forte do que nunca—não só por conta de sua paranoia, mas também pelo encontro estranho com Tammy Wyler.

Danielle apressou-se para fazer o resto das compras, quase batendo em uma senhora na sessão seguinte. Fez o auto-pagamento (porque não queria lidar com caixas se não precisasse) e correu para o carro. Quando voltou a sentir o ar fresco, sentiu-se um pouco melhor. Claro, talvez o autor das cartas estivesse sentado em um dos carros no estacionamento. Talvez ele estivesse seguindo-a no mercado, escutando sua conversa estranha com Tammy.

Colocou suas sacolas no banco de trás e ligou o carro. Antes de conseguir dar a ré no estacionamento, seu telefone tocou. Ela viu o nome da Martin na tela e não hesitou em atender. Se ele estivesse ligando para discutir, ela ia gostar. Se ele quisesse pedir desculpas, também. Na verdade, ela apenas gostara da ideia de falar ao telefone com alguém que conhecia naquele momento.

Ela atendeu com um simples “Ei”.

- Ei, Danielle – Martin disse. – Olhe, eu te devo mil desculpas por ontem à noite. E não só por ter sido grosso. Eu não devia ter sido tão estranho com o telefone. É que as coisas estão uma merda no trabalho. As mensagens eram sobre isso. Eu sabia desde que elas começaram a chegar. Eu não queria lidar com isso ontem. Faz sentido para você?

- Faz. Mas o que não faz sentido é porque você não me disse isso ontem.

- Porque eu sou idiota – ele disse. – Eu não queria que você soubesse que meu trabalho pode estar prestes a se acabar. E depois você ficou brincando, e eu entendi tudo errado. Danielle.. Eu nunca machuquei uma mulher. Por favor, acredite em mim. E colocar minhas mãos em você ontem... Meu Deus, me desculpe!

Ela não disse nada. Seus braços estavam ainda um pouco vermelhos e ela havia se sentido em perigo. Mesmo assim, podia sentir uma tristeza genuína na voz dele.

- Danielle?

- Estou aqui – ela disse. – Só que... Queria que você tivesse me dito tudo isso antes de chegarmos naquele ponto.

- Eu sei. Por favor... você pode me desculpar?

Ela sabia que sim. Estava simplesmente tentando pensar no que fazer para virar as coisas em seu favor. Ela sorriu ao ter uma ideia e não conseguiu resistir.

- Bom, esse negócio de “relação sem nada” vai acabar. Você vai me encontrar no meu apartamento essa noite e vamos nos pegar. Não vou dormir com você ainda, mas... bem, vai rolar alguma coisa.

- Hum... tudo bem. Posso fazer isso – ele disse, claramente confuso, mas feliz.

- Não é só isso. Minha irmã se mudou para cá. Te falei, certo?

- Sim.

- Bom, é um bairro estranho. Desses que fazem festas de bairro. Ela me convidou para a festa do final de semana. Quero que você vá comigo.

- Ah, certo. Posso fazer isso.

- Bom – ela disse. – Te vejo à noite, então.

Ela desligou sem se despedir. Gostava de saber que ele não tinha ideia de como respondê-la. Também gostava de saber que estava basicamente no controle agora—não de um jeito desleal, mas poderia se sentir mais confortável perto dele.

Sentindo-se um pouco melhor, com a paranoia sendo agora apenas uma sementinha na cabeça, Danielle foi para casa. E ficou feliz em perceber que estava animada para a noite. Fazia muito tempo que ela queria sentir as mãos de um homem em seu corpo.

Aquele pensamento, junto com a paranoia indo embora, a fez pensar se Martin poderia ser o cara certo para ela ao final das contas. Ele parecia estar mudando tudo nela. É claro, ele sabia pouco sobre ela, e ela iria manter as coisas desse jeito o quanto pudesse.

Ela seguiu para casa, começando a pensar no que deveria vestir para ir a uma festa de bairro.

Aquilo foi quase o suficiente para fazer sumir a paranoia que aparecera pela manhã e a seguira até o mercado.

Quase.

Pegou seu telefone e discou o número de Chloe. Nem deixou a irmã dizer Oi antes de começar a falar.

- A festa do bairro... Posso levar um cara?

- ...Sim, claro – Chloe disse, claramente surpresa.

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